Há muito tempo quero escrever-te,
ou seria escrever sobre você?
Temos tanto tempo juntas que
nossa intimidade me impediu de te delimitar ou compreende-la o suficiente para
que eu me sentisse a vontade em dispor de palavras ao seu respeito.
Mas, agora pareço estar pronta.
Tanto tempo marcada pela sua existência
silenciosa e incompleta, assim como sua representação peculiar dentro de cada
ser humano.
Mas, eles não parecem conhecê-la
como eu. Será que você vem sorrateira a eles como veio a mim?
Tão mansa como uma névoa lenta de
inverno, mas não dissipa, vem pelos pés e sobe a cabeça e fica.
Permanece fria e inconsequente.
Fatal.
Às vezes não sei se essa realmente
é a sua intenção. Consumir tudo até que não exista nada, até tornar tudo parte
de você mesma. Embriagar-se totalmente com os restos do que sobra de mim. As vezes parece-me
que quer ser minha companheira.
Há quem goste de você, sei disso,
há quem aprecie sua presença ausente, quem não lhe note de fato.
Há quem lhe estenda a mão como
uma velha amiga.
Então, por um tempo tentei aceita-la
também, aprecia-la. Quase aprendi a conviver com teu vazio absoluto.
Tentei lidar com sua morada sendo
instalada cada vez mais no meu âmago cansado.
Por fim, tentei destruir sua
morada.
Desmontá-la,
arranca-la,
esmaga-la.
Assim como você mesma tem feito comigo, a
cada dia que tem passado ao meu lado.
A diferença foi que você
conseguiu.
E não pereceu,
permaneceu
cresceu
fundou-se primeiro nas pontas dos
pés até entalar-se em minha garganta.
Então eu resolvi deixá-la aí.
Eu
desisti.
Desisti de tentar vencê-la,
afinal você é parte de mim agora.
Tentar resisti-la só me fez em
farelos.
Então aproveitarei enquanto você
ainda é parte. Enquanto não saboreou todas as migalhas, aproveitarei até.
Até que você me consuma por
inteiro.
Até ser a única solitária versão
de mim.
Peço que não me leve a mal. Afinal
você foi quem ou o que sobrou.
Atenciosamente
da parte que ainda resta de
Jane.
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